Elcio Queiroz e Ronnie Lessa durante julgamento.
Agência Brasil
Após seis anos de investigações e um longo processo judicial, o 4º Tribunal do Júri do Rio de Janeiro condenou nesta quinta-feira (31) os ex-policiais Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz pela execução da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. Lessa foi sentenciado a 78 anos, 9 meses e 30 dias de prisão, enquanto Élcio recebeu uma pena de 59 anos, 8 meses e 10 dias.
A decisão do júri, que inclui três acusações — duplo homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio contra Fernanda Chaves, assessora de Marielle, e receptação do veículo usado no crime — marca uma resposta judicial aguardada. A juíza Lúcia Glioche, ao ler a sentença, salientou a importância do veredito: “A justiça por vezes é lenta, é cega, é burra, é injusta, é errada, é torta. Mas ela chega. Mesmo para acusados que acham que jamais vão ser atingidos. A justiça chega aos culpados e tira o bem mais importante deles, depois da vida, que é a liberdade”.
Além das penas, ambos foram condenados a pagar pensão ao filho de Anderson, Arthur, até ele completar 24 anos, e também a indenizar cada uma das vítimas com o valor de R$ 706 mil. Os condenados estão presos desde 2019 e fecharam acordos de delação premiada, enquanto as investigações ainda apontam como supostos mandantes os irmãos Chiquinho e Domingos Brazão, que possuem vínculos políticos e estão presos.
O julgamento destacou as motivações dos crimes. Segundo o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), Lessa e Élcio teriam matado Marielle por interesses financeiros, tentando eliminar Anderson e Fernanda para não deixar testemunhas. O MPRJ argumentou que ambos sabiam que a execução foi encomendada devido ao papel político da vereadora e suas causas sociais. Nas alegações, o MPRJ enfatizou que “eles não se arrependeram e só fecharam acordo de delação porque sabiam que seriam condenados”.
A defensora pública Daniele Silva, atuando como assistente de acusação, destacou o aspecto racial do crime, afirmando que Marielle, mulher negra e vereadora engajada, “mexeu com as estruturas” ao incomodar setores estabelecidos. O MPRJ também mencionou a preparação minuciosa de Lessa, que pesquisou tanto a arma do crime quanto informações sobre Marielle, enquanto Élcio teria feito buscas sobre aliados da vereadora.
As defesas de ambos os réus sustentaram que, apesar das confissões, seus clientes deveriam ser condenados “dentro dos limites de sua culpabilidade”. O advogado de Lessa, Saulo Carvalho, reconheceu a participação de seu cliente, mas argumentou que “sem a confissão e colaboração, seria difícil condená-lo apenas com as outras provas”, questionando também a atribuição de motivos políticos. A defesa de Élcio, feita por Ana Paula Cordeiro, afirmou que ele não conhecia Marielle e acreditava que Lessa, tido como “exímio atirador”, evitaria danos a terceiros.
A decisão vem à tona enquanto o processo contra os supostos mandantes, incluindo o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, Chiquinho Brazão, e o deputado federal Domingos Brazão, segue no Supremo Tribunal Federal (STF), envolvendo ainda o ex-policial Robson Calixto e o major Ronald Paulo Alves Pereira, acusado de monitorar Marielle. Investigadores apontam que as motivações do assassinato podem estar ligadas a interesses de milícia e conflitos em torno de um projeto de lei para regularizar um condomínio na Zona Oeste do Rio, defendido por Chiquinho e criticado por Marielle.
No segundo dia de julgamento, o Ministério Público fez uma réplica de duas horas reforçando os pedidos de condenação, enquanto as defesas de Ronnie e Élcio usaram parte do tempo de tréplica para argumentar contra algumas qualificações dos crimes. O resultado do julgamento marca um desfecho importante em um dos casos mais emblemáticos da justiça no Brasil.
Da redação